domingo, 29 de dezembro de 2013

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Ligar à ficha sff


Lisboa - Teatro Maria de Matos

domingo, 22 de dezembro de 2013

quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

Pearl Plágio

A discussão é antiga, mas o mal das cópias é que só raramente superam os originais.
Há uma canção dos Pearl Jam que não consigo ouvir: "Down", um lado B do single 'I am Mine' de 2002, mais tarde compilada para o álbum de hits "Lost Dogs". Parece que sempre que começa vêm aí os Xutos & Pontapés.
Não dá, porque a entrada e o refrão são a cópia cuspida do "Maria", do álbum '88' de 1988 e não falem em inspiração.
Ninguém é perfeito, mas isto é rip-off.





segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Peter O' Toole (1932 - 2013)



“I did quite enjoy the days when one went for a beer at one’s local in Paris and woke up in Corsica.”

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

El Calafate - 4º e 5º dias


(o Perito Moreno, por Eduardo Salavisa, tirado daqui)


A Patagónia argentina. Estou finalmente na Cordilheira dos Andes que desde pequeno queria conhecer por causa das histórias do Marco Pólo.
Aterrámos numa terra pequena, quase deserta mas servida por um moderno aeroporto, limpo e arrumado. Vínhamos à procura do Perito Moreno, o gigantesco e impressionante glaciar do Sul da Argentina que faz fronteira com o Chile. O céu estava limpo e o ar gelado.
El Calafate é o nome de um arbusto muito comum que dá umas pequenas bagas, tipo groselhas, que utilizam para fazer o doce de Calafate.
Instalámo-nos no Hotel Michelangelo, uma pequena casa em madeira que dava para a rua principal e fomos conhecer a terra. Tudo aqui são casas em madeira e há três, quatro ruas. Há alguns pinheiros mas tudo parece bastante seco. Procurámos alguém que nos levasse ao Perito Moreno e marcámos lugares numa camioneta para o dia seguinte. Entrámos numa pequena loja que vendia acessórios para as expedições onde folheei alguns livros para saber mais sobre amanhã.
À noite, de botas calçadas e cercados por montes gelados, parámos num restaurantezinho. Pedi a rara "merluza negra" grelhada e um vinho branco da Adega Lopez.
Conhecemos Ehud, um israelita simpático que também vai ao Perito Moreno. Acaba a jantar na nossa mesa. Provoco a questão israelo-árabe e ele altera-se. Diz que não percebemos. Não enquanto não assistirmos a um autocarro com crianças a ir pelo ares.
Fomos dormir.

Acordámos cedo.
Uma camioneta gasta e com o vidro da frente todo estalado veio-nos buscar.
Andámos cerca de 80 kms numa estrada sinuosa e ainda em construção. Não há nuvens e o sol aquece um pouco.
Dizem que temos sorte, que é a melhor forma de alcançar o glaciar.
À medida que nos vamos aproximando, apercebemo-nos de pequenos icebergues e pedaços de gelo do tamanho de casas a boiar na água límpida e azul turquesa do Lago Argentino, o maior lago de água natural da Argentina. São já o resultado dos desprendimentos do Perito Moreno.
Chegamos e é assombroso ! Nunca nada de semelhante. O motorista trafica-nos um conselho: não peguem na máquina fotográfica e tirem a fotografia com os vossos olhos, prolonguem o momento até que ele entre no fundo, que um dia quando estiverem nos vossos escritórios vão fechar os olhos e lembrar-se disto. 
É enorme ! Parece que um dia foi um oceano desprevenido que veio desaguar nestas montanhas e que aquí se quedó para sempre congelado. Branco, azul, cheio de fracturas que a tempo darão lugar a novos desprendimentos e a mais icebergues.
Oiço trovões tremendos, que afinal são o som dos blocos enormes do glaciar a desfazerem-se contra aquele chão de água: esmagador. Depois vão-se escutando pequenos "cracks" do gelo que estala com a pressão.
A Cristina deu-me a máquina para as mãos. Não queria que eu perdesse a altura dos desprendimentos. Para depois mostrar em Lisboa.
Só que, tolhido por aquela demonstração de força da natureza, não me mexia, incapaz de reagir no timing certo, parado a olhar de respiração cortada. "Então, não tiraste ?" E eu... sem forças. Nem ao menos para impedir que me arrancasse a máquina do colo.

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

O Passageiro do Tempo


"105 anos ??? Pai, este homem é o homem mais velho que existe. Deve ter muita saúde."
Rodrigo 

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Nadir Afonso: 1920 - 2013

 
Estação dos Restauradores, Lisboa

terça-feira, 10 de dezembro de 2013

segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Mandela (1918 - 2013)


“When a man is denied the right to live the life he believes in, he has no choice but to become an outlaw.”
Nelson Mandela



Old pirates, yes, they rob I;
Sold I to the merchant ships,
Minutes after they took I
From the bottomless pit.
But my hand was made strong
By the 'and of the Almighty.
We forward in this generation
Triumphantly.


(...)

Emancipate yourselves from mental slavery;
None but ourselves can free our minds.
Have no fear for atomic energy,
'Cause none of them can stop the time.
How long shall they kill our prophets,
While we stand aside and look? 
Ooh!
Some say it's just a part of it:
We've got to fullfil the book.


Won't you help to sing
This songs of freedom
'Cause all I ever have:
Redemption songs;
Redemption songs;
Redemption songs.

'Redemption Song', 1980 - Bob Marley

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Freedom !

Emociono-me sempre que vejo alguém defender a liberdade de expressão e a liberdade de informação, para mim as duas maiores bênçãos da Democracia.

Ontem, o editor do 'Guardian', Alan Rusbridger, prestou depoimento perante uma comissão parlamentar em que reiterou a decisão de publicação do material cedido pelo agora proscrito e perseguido ex-NSA, Edward Snowden.

A certa altura, perguntaram-lhe: Do you love this country?"

A resposta:

"We live in a democracy and most of the people working on this story are British people who have families in this country, who love this country. "I'm slightly surprised to be asked the question but, yes, we are patriots and one of the things we are patriotic about is the nature of democracy, the nature of a free press and the fact that one can, in this country, discuss and report these things."


quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Buenos Aires - 3º dia


(foto: cristina)

Há dias em que o vento sopra a favor.
Até nem estava frio, mas de manhã recebo bem aquele arzinho seco que acorda e limpa a noite toda da cara.
Na Recoleta, bairro nobre da cidade, na avenida Aranales, vêem-se lojas finas, lojas caras com montras requintadas e as pessoas são distintas e estão bem vestidas. Sapatos engraxados, sobretudos escovados, um ou outro chapéu e bigodes aparados. As senhoras, muito europeias e de costumes antigos, têm o cabelo armado, bolsas de pele e tomam o chá que é trazido numa bandeja (onde também vem o tabaco) por empregados de casaco branco e laço ou gravata preta.
Dizem-nos que temos de ir ao "San Juanino", em Posadas, provar as empanadas. Obedecemos porque vemos que é carinho e cheiravam a delícia terrivel. Ou a fome é que já fala à bruta. 
Continuamos a coleccionar bairros. 
Palermo Viejo é uma área de habitações assim estranha. Os prédios velhos e decadentes e as ruas um bocado sujas contrastam muito com as cores alternativas com que pintam outros que têm mais sorte e estão entregues a malta nova e revolucionária. Há também muitas lojas que vendem coisas modernas, coloridas e originais.
Já é noite porque o tempo é supersónico quando não olhamos para ele.
Abençoados por essa graça, eis Gerardo Gandini, a surpresa inesperada. Como só acontece quando se faz amor raro com o mundo e não se preparam calendários ou menus.
Às oito e meia descíamos a 9 de Julio sem pensar para onde, já em frente ao magnífico Teatro Colón. Num flash de lince a Cristina repara no cartaz colado na parede que anunciava:
  
Tangos en el Colón
Funcíon Extraordinaria, Hoy, 20h30m, Gerardo Gandini interpreta Piazzolla

Como é que é ?
Era aquele o dia. Era a hora. Estávamos ali. Maestro Gerardo Gandini, pianista, antigo membro do sexteto de Piazzolla, a solo.
E bilhetes a 5 pesos !!! Minha mãe, €1,50 para ouvir tocar um Maestro ! E lugar num camarote. É Milagre com 'M' grande. 
Aos primeiros acordes já nos benzemos. E ao nosso lado, um velhote acompanha os tangos que conhece de cor, "TutuTurututu, Tuturururu ruru ruru ru" 
Genial !

De manhã mandámos uns e-mails para Lisboa.

domingo, 24 de novembro de 2013

Requiem por ti

Fechou o Londres. Não agora, há pr'á aí um ano.
Fechou o Quarteto, 
o Mundial, 
fechou o Ávila. O Turim e o Cine 222. E o São Jorge é só para festivais. E o Cinema Roma acho que nem isso.
Para não falar do Condes, do Europa, do Império, entregue à seita brasileira (crime à cidade !) ou dos Alfas. 
No Caleidoscópio, ali para os lados do Campo Grande, também houve uma salinha. E até o Restelo teve um cinema no bairro, onde vi o 'Regresso ao Futuro', quando era puto.
Fecham os cinemas todos de rua.
Mas há centros comerciais e cheiro a gordura e a milho cozinhado.
Que porra !, não poder ir ao cinema, só cinema. De ter que atravessar corredores de lojas e de gente desalmada que vai para outro lado, ou vai se calhar às multi-hipóteses de outras 20 salas, e tanto lhes faz porque só quer encher barriga.
Futuro de merda. Ir ao cinema não é só aos filmes. É deixar o carro na rua e não me soterrar no inferno de um parque debaixo do chão. É ver pessoas e os bairros da cidade e as ruas, e isto assim, isto faz mal.

Sobrevive o Nimas, o Monumental vá, o Alvalade e o Fonte Nova, que é Centro, mas a gente perdoa-lhe. E agora foi-se o King.




(foto: andré raposo)

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Corcovado



foto: Mário Cruz

CR7 3 - Suécia 2

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Vhils em Lisboa - Parte 5 e 1/2*



Jardim do Tabaco
(foto: andré)

*com Pixel Pancho

sábado, 16 de novembro de 2013

Grand Slam





Voltariam a encontrar-se. Agora no 1º round do Torneio dos 111 anos do CIF. Difícil haver melhor local, mas quanto custa uma final antecipada...
Quando um dia se escreverem as crónicas das grandes batalhas do ténis amador lisboeta, dois nomes vão sobressair.
Quando a distância e o tempo permitir que se falem das grandes rivalidades da primeira metade do século XXI, Junqueiro, Iceman JunKas, e andré (aka Rasputine), vão preencher os anais.
Quando já for a lenda a contar o que foi aquela partida, as novas gerações vão aprender duas coisas: que Junkas é capaz de recuperar o fôlego umas 500 vezes de pura frieza mental, e que Raspa tem a garra de um cão.
Meus senhores, o que se viu hoje no nº 6 do CIF, não foi um jogo, foi uma luta épica pela sobrevivência. Como é sempre que jogam.
Para a multidão que assistia nem faltou o tira-teimas do terceiro set, e mesmo durando há duas horas e quase meia, e as famílias já cobrassem e o ucraniano que arruma o court só olhasse para o relógio, ninguém arredaria o pé.
Reparem que quando no primeiro set, se alternavam os pontos ganhos, ora Raspa, ora Junkas, ninguém podia adivinhar o vencedor, mesmo com o match-point em 5-4, a favor de Raspa mas este fosse, afinal, o canto do cisne.
Do outro lado, o muro imperturbável de Junkas, senhor de uma capacidade atlética invulgar construída no rugby federado (vê-se bem o carácter que um Benfica molda num homem), não se deixou melindrar e, com o rasgo dos predestinados, empatou a partida nos 5-5, levando o jogo para a incerteza dos penalties onde cada erro é fatal. E foi aí, na tranquilidade de um cruzeiro que já cavalgou as ondas de 20 metros, que acabou por vencer o primeiro set num esclarecido 5-7 a um Raspa pronto para arrancar o próprio escalpe.
Reviravolta conseguida.
Mas Raspa não podia deixar mal quem aposta em puro sangue.
Briguento e aquecido pelo motor todo em explosão, atacou, atacou e atacou. Foi buscar o serviço e começaram a brotar ases. Quando já tirava smash-slams como se fossem cafés parecia o Pete Sampras. Claro que a barragem que estava do outro lado não deixava de devolver, e continuava a bater ora fundo, ora curto, ora longo, ora rede. Junkas sem baquear. Um poço de gelo, sempre em economia de esforço, a fazer saltar um Raspa que já era um galgo numa corrida de Inglaterra.
Os números do segundo set só reflectem as ganas de um homem despeitado. Depois de um rápido 4-0 inicial, Junkas ainda reduz para 4-1, mas Raspa não podia cair outra vez no canto da sereia e arrancou, em puro braço de ferro, o 5-1. Números enganadores porque Junkas não dá abébias. No way. Daí a rivalidade actual. E o último jogo ainda chegou aos 40-40.
Vantagem para um, vantagem nula, vantagem para outro, vantagem nula. Ninguém a desfazer. Ninguém a declarar derrota. Ninguém a erguer a bandeira branca.
Depois de uma demorada troca de bolas (se alguém as tivesse contado, saberia que foram 24), eis uma que decide morrer no lado mais gelado do court, fechando o 6-1 do segundo para Raspa. Empate e tudo remetido para a negra.
Há dias em que ninguém merece vencer, mas é um torneio e vamos para o terceiro set.
Começa melhor Raspa, ainda embalado, apontando um 3-1.
Junkas recupera e empata a 3-3, altura em que Raspa duvida de si e pergunta para quando ver-se livre disto. A resposta chega com jogo para Raspa, e 4-3. Junkas repete a graça do primeiro set e 4-4.
Raspa mergulha no poço da suas forças à procura de uma luz e consegue chegar ao 5-4.
Mais uma vez, na frieza de quem até pode perder, mas só por cima do seu cadáver, Junkas atira tudo para um 40-15 à maior, a que Raspa devolve ao empate 40-40 porque não se podia repetir o passado. E então, numa absoluta troca de vantagens, acaba Raspa por levar Junkas de vencido. Fim. 6-4.
Cumprimentos apresentados, com o amargo de não poderem disputar o troféu na final.
corpo regressou quebrado de mais um mano-a-mano, chegou a pensar que ainda lhe dava ali alguma coisa, mas há dias assim, em que só um pode vencer.

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

A Case of Her




Roberta Joan Anderson
70 no dia 7.

domingo, 10 de novembro de 2013

Buenos Aires - 2º dia


(foto: cristina)

Buenos Aires. Duvido que haja cidade com nome mais bonito. Talvez Lisboa. Mas essa é pátria. Não sei.
Quando viajo é para me levantar cedo e atirar-me para as ruas. Um miúdo numa loja de brinquedos. Tomar um grande pequeno-almoço e submergir. Chupar tudo. Engolir mais.
Decidimos apanhar um táxi (a preço de saldos) e ir para 'La Boca'. Bairro pobre, do Caminito, canción. Gardel. Bairro rafeiro de navalha à cintura e tatuagem nos braços. Rostos trigueiros e rostos traçados de rugas. De olhos rasgados e cicatrizes na alma que nos miram desconfiados. O estrangeiro aqui é penetra. Não se contam os segredos de família e não se diz de quem é o filho. Bairro azul, amarelo, verde, vermelho. Cores violentas. Berram ao máximo. Cores puras. Verdadeiras, sem meias-tintas. Bairro do clube más lindo. Clube do povo. Operário. Fiquei Boca acho que logo.
Entramos num velho café de esquina, de portas que chiam. Em Buenos Aires, tropeçamos neles. Fumo um cigarro ou dois. Olho bem para as pessoas. Jornais espalhados no balcão. Escuto as conversas do dia. Dois velhos de voz rouca comentam o jogo da véspera. Têm um charuto nos dedos e pedem um uísque. O cabelo branco puxado atrás, muito penteado. Oiço aquele espanhol açucarado, cantado, espanhol meio italiano meio brasil de tantas emigrações. De tanta gente. Fico apaixonado. Falo com eles. Como eles. Falamos dos tempos maus. Da ditadura. De Ménem e do futuro Kirshner. Da economia. Deliram porque vão correr com a Repsol do país. Falo de Portugal. Querem saber da Europa como se fossem primos. Distraio-me e olho pela janela baça. Que longe de Lisboa!
Deixamo-nos estar um bocado mais por ali. Acho que arranco um bife de chorizo, puro sangue. Alto e grosso. Cheio de carne.
Regressamos ao centro e percorremos as avenidas largas e que não acabam. É quando a Cristina encontra um Teatro construído com histórias. A "Ateneu". Agora é celebre. Subimos aos camarotes para ver os romances. Na plateia, a política e a história. No primeiro balcão vejo livros de cinema, música, fotografia e arte urbana. Pegamos nuns, olhamos para outros e acabamos no segundo balcão com as obras dos embaixadores. Piazzolla e "Fervor de Buenos Aires" do J.L. Borges.
Não sei se ainda existe, mas no "Camaná" partilhámos, finalmente, o primeiro mate, espécie de chá feito da erva com o mesmo nome que levam com eles para todo o lado.
Insuportavelmente amargo. Cometemos o pecado capital. Juntamos açúcar porque tinha que ser. Quando o amargo acaba de afastar o intruso, esvai-se completamente como se fosse por um cano à parte e deixa um sabor calmo debaixo da língua. A vida é boa.

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

O Leopardo

Em África há um caçador furtivo.
Caça à noite, sozinho e só raramente é visto.
Às vezes só já em cima das acácias onde recolhe o peso do corpo quando termina a matança.
É rápido, silencioso e letal. Uma máquina de matar. Não mata mais do que precisa. É nobre. Mas quando ataca não perdoa. A presa tem apenas uns segundos de terror antes de sentir o oxigénio acabar e o sangue gelar para sempre. 
Em África aprende-se cedo a diferença entre viver e morrer. Quando o capim é jovem e o sol ainda não levantou. Todos sabem. Homem ou não.

Estamos longe da savana, mas Samuel Eto'o recorda-nos onde começa o mundo. Sentindo o cheiro da carne fresca, preparou-se. Sozinho faz um 'S', primeiro a um tempo devagar, para escapar ao ângulo de visão da presa que esqueceu onde começa tudo. Depois, silencioso e letal, lança-se em aceleração rumo ao alvo com as garras afiadas e os dentes todos de fora.  
Eto'o felino. Como o leopardo. Não foi sorte. Foi fera.

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

domingo, 3 de novembro de 2013

Buenos Aires - 1º dia


(foto: cristina)

Em Buenos Aires começa a Primavera.
Ainda se sente o frio que vem do inverno acabado.
No aeroporto Ministro Pistarini há homens que oferecem o táxi para nos levarem ao centro. "Si, cuanto lo arreglamos ?"
Demoramos cerca de meia hora a chegar a Viamonte, atravessando alguns quilómetros dos extensos subúrbios de lata e tijolo em carne viva onde vive gente que é pobre.
Eram 7h30m e, por isso, despejámos as malas no hotel e fomos logo a uma cafetaria ali perto tomar o pequeno-almoço. Dois chocolates quentes e um par de media lunas.
O voo tinha sido chato, longo, de Lisboa uma hora para Madrid e de Madrid para B.A., durante a noite e, como é hábito, só durmo quando o avião está a levantar. Depois, zero, sempre desconfiado destes bichos. Ainda para mais, dei trela a um puto argentino que vinha sozinho e sentado ao meu lado. Era o Dario, do Boca e só queria falar. Regressava de umas férias na Europa para as aulas no liceu e devia apetecer-lhe tanto isso como dormir um bocado.
De modo que o pequeno-almoço soube bem depois do ar frio cortar a cara logo cedo que é a melhor forma de acabar com o torpor do raio de um avião.
Era domingo, e aos domingos as pessoas dirigem-se para a feira de San Telmo, a velha feira de antiguidades de Buenos Aires. Fomos para lá a pé.
À medida que nos aproximávamos, dava para adivinhar que íamos chocar com um tango vadio. A música que saía de um velho rádio ronfenho num volume razoável circulava entre nós como se fosse mais um turista. No meio da Plaza Dorrego dois dançarinos, ele de colete e ela de vestido preto e cabelo apanhado, cruzavam as pernas um no outro freneticamente e um chapéu no chão juntava os trocos. Demos uma volta pelas velharias. Quadros rafeiros, candeeiros arte nova oxidados, relógios de bolso parados, livros usados, latões, recipientes para o yerba mate, retratos de Gardel, Evita e Maradona, grafonolas e discos de vinil de 78 rotações enchiam prateleiras e prateleiras das lojas de San Telmo.
Distraio-me sempre a ver estas coisas que outros usaram, que viveram em salas, quartos e varandas e que acabam ali, meio mortas, vendidas por tuta e meia ou que alguns colectam do lixo.
Acho que alguém nos tirou da rua para almoçar. Anunciavam uma parrillada do outro mundo e com o peso a valer um terço do euro só se fosse estúpido é que os mandava dar uma curva. Sentámo-nos com calma a chupar o suco daquela grelhada mista de carnes de primeira. Ia já a meio quando escutei o som melancólico de um bandonéon cheio de pena e abandono. Se os portugueses têm saudade, os porteños têm Piazzolla. Piazzolla não é música apenas. É toda a tristeza de um povo enfiada nos acordes de um instrumento que chora tudo o que tem. Ou então eram os dedos do maestro.
Já não sei como é que fomos dali para o monumental obelisco da 9 de Julho, a maior avenida do mundo com sete faixas para cada lado e dez minutos para atravessar, mas antes ainda passámos na Plaza de Mayo, onde, ano após ano, em frente à Casa Rosada, as mães de Maio se concentram para lembrar os "desaparecidos" do regime de Videla. Só depois é que nos enfiámos nas ruas do Retiro, outro bairro de Buenos Aires.
Buenos Aires é uma cidade de barrios.
Passaram 10 anos desde que pisámos a Argentina, país dos seis continentes.

Sunday Morning




"To our neighbors:
What a beautiful fall! Everything shimmering and golden and all that incredible soft light. Water surrounding us.
Lou and I have spent a lot of time here in the past few years, and even though we’re city people this is our spiritual home.
Last week I promised Lou to get him out of the hospital and come home to Springs. And we made it!
Lou was a tai chi master and spent his last days here being happy and dazzled by the beauty and power and softness of nature. He died on Sunday morning looking at the trees and doing the famous 21 form of tai chi with just his musician hands moving through the air.
Lou was a prince and a fighter and I know his songs of the pain and beauty in the world will fill many people with the incredible joy he felt for life. Long live the beauty that comes down and through and onto all of us.
— Laurie Anderson
his loving wife and eternal friend
                                                                                                                                            East Hampton Star

segunda-feira, 28 de outubro de 2013

"NYC Man" *



[foto: andré]
[NYC, Outubro 2011]

You say "leave" and I'll be gone
without any remorse
No letters faxes phones or tears
there's a difference between bad and worse

I'm a New York city man, blink your eyes and I'll be gone
New York city - man, M-A-N, you blink your eyes and I'll be gone

New York city, I love you, New York city man
New York city, how I love you, blink your eyes and I'll be gone
just a little grain of sand
New York city, ooohhh, how I love you
New York city, baby, blink your eyes and I'll be gone
Oh, how I love you



* "Set the Twilight Reeling", Lou Reed, 1996

sábado, 26 de outubro de 2013

A hora íntima



Quem pagará o enterro e as flores
Se eu me morrer de amores?
Quem, dentre amigos, tão amigo
Para estar no caixão comigo?
Quem, em meio ao funeral
Dirá de mim: — Nunca fez mal...
Quem, bêbado, chorará em voz alta
De não me ter trazido nada?
Quem virá despetalar pétalas
No meu túmulo de poeta?
Quem jogará timidamente
Na terra um grão de semente?
Quem elevará o olhar covarde
Até a estrela da tarde?
Quem me dirá palavras mágicas
Capazes de empalidecer o mármore?
Quem, oculta em véus escuros
Se crucificará nos muros?
Quem, macerada de desgosto
Sorrirá: — Rei morto, rei posto...
Quantas, debruçadas sobre o báratro
Sentirão as dores do parto?
Qual a que, branca de receio
Tocará o botão do seio?
Quem, louca, se jogará de bruços
A soluçar tantos soluços
Que há de despertar receios?
Quantos, os maxilares contraídos
O sangue a pulsar nas cicatrizes
Dirão: — Foi um doido amigo...
Quem, criança, olhando a terra
Ao ver movimentar-se um verme
Observará um ar de critério?
Quem, em circunstância oficial
Há de propor meu pedestal?
Quais os que, vindos da montanha
Terão circunspecção tamanha
Que eu hei de rir branco de cal?
Qual a que, o rosto sulcado de vento
Lançará um punhado de sal
Na minha cova de cimento?
Quem cantará canções de amigo
No dia do meu funeral?
Qual a que não estará presente
Por motivo circunstancial?
Quem cravará no seio duro
Uma lâmina enferrujada?
Quem, em seu verbo inconsútil
Há de orar: — Deus o tenha em sua guarda.
Qual o amigo que a sós consigo
Pensará: — Não há de ser nada...
Quem será a estranha figura
A um tronco de árvore encostada
Com um olhar frio e um ar de dúvida?
Quem se abraçará comigo
Que terá de ser arrancada?
Quem vai pagar o enterro e as flores
Se eu me morrer de amores?

Rio, 1950


Vinicius de Morais, "o homem dos vícios imorais"

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

"Quem quererá, agora, falar com ele ?", por Vasco Pulido Valente


Trainspotting


«Para José Sócrates a classificação de quem o contraria é simples. O PSD é um conjunto de “pulhas” e de “filhos da mãe” (calculo que a expressão foi, por assim dizer, mais vernácula) e em geral “a Direita é hipócrita”. Santana é um “bandalho”. Teixeira dos Santos teve “uma atitude horrível connosco”, ou seja, com ele. Schäuble, o ministro das Finanças da Alemanha, é um “estupor”. E por aí fora. De resto, ele, Sócrates, quando falhou (e, na opinião dele, quase não falhou) não teve nunca a mais vaga responsabilidade ou culpa: a verdade está em que grupos de “pistoleiros”, incluindo a Casa Civil do Presidente da República, tentaram sempre impedir que ele governasse e espalharam infames calúnias para “atacar” o seu impoluto “carácter”. Apesar de primeiro-ministro, não passou de uma vítima.Vale a pena repetir o que toda a gente já sabe? Vale, porque este “chefe” (como ele mesmo se descreve) e este acrisolado democrata (como ele se declara) saiu do assento etéreo onde subira, com um saco de ressentimento e ódio, que excede, e excede por muito, o de qualquer político desde que existe um regime representativo em Portugal. Ninguém, por exemplo, disse como ele que não queria voltar a “depender do favor do povo”, a quem atribui uma larga parte das suas desventuras. Dar uma réstia de poder a semelhante criatura (visto que Deus não parece preparado para o ungir) seria inaugurar uma campanha de represálias contra Portugal em peso: contra a “aristocracia” do PS (que ele se gaba de ter “vencido”), contra a Direita, contra o velho Cavaco, hoje apático e diminuído, e principalmente contra o povo, que não votou por ele em 2009.Ora Sócrates, protestando o seu desinteresse pela vida pública e as suas novas tendências para a filosofia, com a convicção de um adolescente analfabeto, só pensa em abrir o caminho para um memorável ajuste de contas. Uma entrevista justificatória na RTP, um programa de “opinião” também na RTP e, agora, o lançamento de um “livro”, para inaugurar um estatuto de “intelectual”, a que nem sequer faltou Mário Soares, Lula da Silva e uma assistência de “notáveis”, seleccionados por convite. O supracitado “livro”, absolutamente desnecessário, é de facto uma prova escolar (uma “tese” de mestrado), sem uma ideia original ou sombra de perspicácia, que assenta na larga citação e paráfrase de – vá lá, sejamos generosos – 30 livros, que se usam pelo Ocidente inteiro, e em algumas fantasias francesas (Sciences Po oblige). O extraordinário não é que Sócrates se leve a sério, o extraordinário é que o levem a sério. Mas claro que o “lançamento” não foi de um “livro”.»

'Público', hoje

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

"I like things that look like mistakes"

Desde que entramos para dentro da sala, no Fonte Nova, parece que nos enganámos. Não no filme (embora não soubéssemos ao que íamos e isso é bom), mas na pessoa que está no filme. A quem nunca realmente percebemos.
Todo o filme é um bocado esquisito, esquisito no sentido óptimo que os ingleses dão à palavra abnormal, que anda à volta da confusão de uma pessoa que não é desarrumada, só muito ocupada, e dos erros e erros de alguém que manifestamente não encaixa no mundo "normal". Ela que veio de Sacramento, de uma família tradicional que reza e se reúne no Natal e que, portanto, nesse desencaixe permanente só podia encontrar algum lugar em Nova Iorque, a cidade onde tudo pode caber.  E de repente somos nós que temos a cabeça confusa com tanto passo em falso, com tanta trapalhada emocional e com tanta coisa que nem ela percebe bem e que é um remoinho de instabilidade. Não é só o corpo e a linguagem que parecem desacertados. Parece que há várias pessoas ali dentro, cada uma a querer falar e fazer ao mesmo tempo que as outras e tudo a ficar incompleto. Ai, Frances Ha !, se fosse teu amigo ficava preocupado. Todos temos que encontrar um caminho, Frances Ha.
Mas depois, no meio dos tropeções que andam dentro daquela cabeça, há um momento lindo e esse vale toda a pena.


quinta-feira, 17 de outubro de 2013

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Sambando na Lama



"Republicanos: os homens-bomba da América"
por Arnaldo Jabor


«Estamos vendo hoje a loucura da América republicana. Eles topam destruir o país para impedir um bom governo para o Obama. Os republicanos estão provando que são os homens-bomba americanos. Morrem junto com o calote da dívida, com a crise profunda que estão programando, mas nem se tocam. Não conseguem aceitar o plano de saúde, uma espécie de SUS, o "Obamacare", para proteger 30 milhões de americanos que não têm seguro-saúde.
Eu já morei nos EUA, antes dos anos 60, no coração da "América profunda", na Flórida, e vi como o americano médio tem a "alma republicana". A cidade era igual aquela do Truman Show. As ruas, pessoas, rituais, sorrisos e lágrimas, tudo parecia programado por uma máquina social obsessiva. A vida e morte eram padronizadas, previstas: abraços gritados, roupas iguais, torcidas histéricas no beisebol, finais felizes, alegrias obrigatórias, formando uma missão comunitária cheia de fé, como um carrossel de certezas girando para um futuro garantido. A violência dos alunos me assustava. Eu era um "nerd" comprido e meio bobo nos meus 15 anos de virgindade, e me chocava com as botas de cowboy marchetadas de estrelas de prata, as facas de mola ("switch blades") de onde a lâmina pulava, os casacos de couro negro que já vestiam a chamada "juventude transviada", uma rebeldia reacionária e "republicana" dos anos de Eisenhower. Vi brigas de ferozes galalaus se arrebentando até o sangue no focinho e o desmaio, onde nem os diretores do colégio podiam interferir, pelo sagrado direito da porrada, na cultura de vaqueiros e pioneiros. Não havia espaço para dúvidas naquela cidade, mas dava para sentir que aquela solidez de certezas, se rompida, provocaria um grave desastre.
Os ídolos da época eram Elvis Presley rebolando na TV e James Dean, cadáver presente nos gestos e roupas. Pairava um clima de intolerância entre os próprios brancos; eram os fortes contra os fracos, eram as meninas bonitas contra as feias, eram as sérias contra as "galinhas". Eu, turista tropical, era um tipo misterioso; tímido, fraco, mas, como era estrangeiro e falava bem inglês, provocava um respeito cauteloso e os machões me poupavam por minha habilidade em dar-lhes "cola" em "spelling", soletrando palavras de raiz latina que, para eles, eram enigmas.
Algumas meninas saíram comigo para beijos na boca e nada mais, claro. Mas, Brenda, mais pirada e sexy, me largou e sumiu com Warren Caputo, italiano que tinha um "hot rod" com pneus de trator. Eu não era "legível" para eles. Eu navegava naquela cultura obsessiva e, bem ou mal, conseguira namorar Melinda Mills, loura pálida, filha de um "ex-marine" que estivera no Rio durante a guerra e que me mostrou um cartão postal do Mangue, onde ele certamente conhecera a Zona e as polacas. Melinda me amava, ela também frágil e boba, e nos beijávamos no cinema onde assistimos An Affair to Remember - lembro-me.
Mas, havia uma outra América dentro da cidade: os negros. Eles passavam de cabeça baixa, o rosto torcido de humilhação, num ódio sufocado e inútil. Amontoavam-se no fundo dos ônibus, em pé, mesmo com os carros vazios e moravam num bairro de madeira e terra, perto do braço de mar onde os barcos pesqueiros de camarão fediam. Aquela injustiça me espantava pela falta total de compaixão, eu que vinha de babás negras me beijando, eu que amava as mulatas cariocas lindas que já povoavam meus desejos aos 15 anos. Eu só via gente negra moldada pelo sofrimento e exclusão, disformes, deprimidos, frágeis mulheres engelhadas, jovens pretos trêmulos e esfarrapados. No ônibus amarelo do colégio, meus colegas louros, ruivos e brutos berravam contra os negros que passavam: "Hey, 'nigger', por que teu nariz é tão chato? Hey, 'nigger', por que teu cabelo é pixaim?". Depois, na época da "integração racial", vi os mesmos negros sendo espancados pela ousadia de se banhar em piscinas públicas, onde aqueles brancos do meu passado jogavam ácido para queimá-los.
Eu tinha medo era dos brancos.
Até que, um dia, chegou a notícia devastadora. Tinha subido aos céus o satélite russo, o "Sputnik", girando como uma bola de basquete em órbita da Terra. Pânico na cidade. Desde 49, quando a Guerra Fria começou, com a explosão da bomba H pelos soviéticos, destronando a liderança dos destruidores de Hiroshima, os americanos esperavam outra catástrofe que viria quase como um filme de ficção cientifica como a A Invasão dos Feijões Gigantes. Em minutos, a cidade parecia um campo de refugiados, de perdedores, com cabeças inchadas, humilhados pelos comunistas invasores. No colégio, começaram "fire drills" incessantes, alarmes evacuando os alunos para porões e abrigos atômicos. O então senador Lyndon Jonhson berrou: "Brevemente estarão jogando bombas atômicas sobre nós, como pedras caindo do céu..."
No alto, o satélite Sputnik humilhava os americanos, com seus "bip bips" como gargalhadas de extraterrestre. A partir desse dia, lá em baixo, na cidadezinha da Flórida, eu mudei. Não para mim, mas para os outros.
Os colegas porradeiros me investigaram com perguntas: "Que você acha? Teu país gosta dos russos?". Eu tremia e escondia minha vaga admiração juvenil pelo socialismo. Eles me olhavam desconfiados: brasileiro, latino, sabe-se lá? Depois disso, não me pediam mais cola de palavras, mal me olhavam. O pai de Melinda, putanheiro do Mangue, não me cumprimentou de sua poltrona esfiapada. Melinda ficou mais pálida e nosso namoro definhou. Há muitos anos, eu vi o "choque e pavor" da América profunda. Essa era a época da chamada "silent generation", passiva e ignorante. Sua reação é a mesma dos fundamentalistas do "Tea Party" hoje. Sempre que algo acontece fora de seu controle, eles bloqueiam o presente e querem voltar ao passado. São mais perigosos que os islamitas guerreiros, que explodem trens e aviões, mas não destroem a economia mundial por rancor, vingança e racismo, como os pequenos canalhas que humilhavam os negros na Flórida quando eu apareci por lá. Vamos aguardar os idos de novembro, quando uma nova recessão pode ameaçar o Ocidente.

in 'O Estado de S. Paulo', 15.10.2013

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

I've been loving you

Otis Redding morreu brutalmente cedo, despenhado num avião aos 26 anos. Mas muito a tempo de entregar a alma toda ao soul e de encharcar a música popular americana com a explosão de um maremoto.
Gravou seis discos em vida e, três dias antes do eclipse total, o tantas vezes celebrado "Sittin' on the Dock of the Bay".
Ainda actuou no Monterey Pop Festival, a meca do rock psicadélico de '67, junto a nomes como Hendrix, Janis Joplin e a Big Brother, Simon & Garfunkel, Canned Heat, Jefferson Airplane, The Animals, The Who, os Mamas & Papas ou Ravi Shankar, abrindo caminho à nova onda que estava para vir.
Foi aí que se se pôde escutar um homem que só podia estar de rastos.

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Lambreta



Vem dar uma voltinha na minha lambreta
Eu juro que eu guio devagarinho
Tu só tens de estar juntinho
Por razões de segurança
E se a estrada nos levar
Noite fora até mar
Páro na beira da esperança
Com a luzinha a alumiar


(de António Zambujo)

"O cultivo de flores de plástico"


"No fundo é isso. Ninguém nos vê. Somos invisíveis. A miséria é uma poção de invisibilidade. Quando as roupas ficam rotas, quando estendemos uma mão, puf, desaparecemos. Somos as pombas dos ilusionistas. Isto dava para um negócio, dava para ganhar a vida com os turistas. Levava-os a ver fantasmas numa cidade assombrada. Levava-os a verem-nos. Olhem, damas e cavalheiros, meninos e meninas, esta é a Lili, tem saudades de ser criança, tem no nariz o cheiro do tabaco dos dedos do pai e crostas nos braços, por aqui, por favor, cuidado com os pés, não pisem as camas, parecem cartões, eu sei, ali ao canto está o couraçado Korzhev, que se deixou ficar, com os ícones na lapela, sigam-me, é um deserto meio russo e traz o barulho do mar nos bolsos, atenção, cavalheiro, saia de cima do cobertor, vejam ali, ali ao fundo, uma genuína senhora de fato, que ainda há poucos meses andava a alcatifar o mundo, minhas senhoras e meus senhores, e ainda tem na voz restos da sua vida anterior, do tempo em que havia casas. Palmas, por favor. E eu ? Eu sou o Jorge, também invísivel como qualquer fantasma, vivo nas ruas. Obrigado, obrigado, e agora, se me permitem, vou comer a minha sopa que está a arrefecer há tantos anos."

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Old Friends


"Isso é a tua novela !", ainda hoje, 20 anos depois, me dói o disparate.
A novela, acusavam lá em casa, era a alienação. A novela eram histórias sempre iguais e mal contadas, mas isto ??? Isto era verdade e acontecia. Era magia. Era lindo. Porque raio me dizia ele aquilo ?
O meu pai sempre mostrou um interesse moderado pelo desporto.
Ver desporto, então, era inútil. Uma desinteligente perda de tempo. Não compreendia o drama de bola na mão, esta entra, esta não, o espectáculo de ver os melhores do mundo a decidirem jogos de vida ou de morte que podiam mudar a 1 segundo do fim. Aliás, nunca viu. E isso talvez explique tudo.
"Percebo que jogues, e gosto, hã, mas isso é uma novela."
Infâmia.
Só porque gravava a meia-hora de resumo semanal que dava aos sábados e, ao domingo, apenas o quarto período (os outros três vinham resumidos) de um jogo que acontecia a mais de 5 mil quilómetros de distância.
Não percebia o meu velho a perfeição da bola no cesto e desse ruído único, e que, ao ver e rever, a gente aprendia e que, depois, ao jogar a base com os amigos no campo do Belenenses, iamos replicar as assistências de sonho do Magic Johnson, os triplos do Larry Bird, mas (e aí confesso) nunca os slam dunks do Michael Jordan. Arte em movimento. Arte pura em slow motion.
Nessa altura, a NBA era uma paixão assolapada, mas daquelas que parece que chegam tarde demais. A velocidade a que as maiores estrelas estavam a abandonar o jogo eram uma chapada no coração. E esse amargo não perdoamos.
Então, com a sangria de absorver tudo o que havia para saber antes de morrer, lá vinha semanalmente a "Super Basket" para casa, a única revista que se vendia em Portugal com tudo sobre a National Basketball Association. Era espanhola, mas adiante.
E gravava os jogos no VHS lá de casa, enchendo quilómetros e quilómetros de fita, acumulando as caixas que a mãe depois plastificava com os recortes das vedetas.
Como a paixão era mesmo séria, ainda respondia aos anúncios que miúdos como eu punham na revista a pedir jogos antigos para a troca, miúdos espanhóis ou da Moimenta da Beira.
Ah ! e lá vinham por correio registado os sagrados Lakers v Celtics de '88 e os Lakers v Pistons de '89, ou todos os jogos onde pudesse apanhar o Magic e os ganchos do Kareem Abdul-Jabbar. Todos narrados em espanhol, mas eu aguentava. 
Showtime !
Ao entrar para a Faculdade, arrumei a bola, as revistas e as dezenas de cassetes.
O tempo era outro, surpreendente e muito novo.
E depois, fuck it, o Magic tinha-se retirado, e o Bird, e até o Jordan tinha migrado para o Baseball.
De vez em quando ainda via nas notícias os resultados de alguns jogos, mas já não conhecia as equipas e os campeões que lá andavam não me diziam nada e eu lembrava-me do que o Alfredo ensinava ao puto no 'Cinema Paraíso': "Vai-te embora e não regresses, porque não vais reconhecer ninguém. Um dia, mais velho, quando voltares, vais ver que está tudo na mesma." Qualquer coisa assim. 
Até ver um monstro de 2 metros de altura chamado LeBron James que afunda, lança longo e defende forte.
Regressou agora tudo em formato nostalgia. Como os velhos amigos que se amam e nunca se esquecem, embrulhadinha num canal do cabo com três letras: NBA.
E logo com um clássico: Celtics v Sixers de '88. Larry Bird de um lado, e o mítico Doctor J., do outro.
Esperem até começarem os playoffs.