segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

A ideia do fim-do-ano


Tenho vindo a deixar morrer a ideia do fim-do-ano, do novo ano, do fim-do-ano. Como as ressacas do dia seguinte faziam prometer.
A deixar que o tempo mate a data do calendário e tudo se trate da linha que continua. O calendário diz que entrámos numa nova década, a segunda depois de 2000 e por isso tudo há-de ser diferente, porque o ano velho ficou para trás e agora tudo vai mudar.
É essa a esperança de viver na ideia do fim-do-ano. Mas há outros calendários e eu olho e os dias vão continuando. Ontem também foi domingo. E amanhã também é terça-feira. E por isso já não me apaixona a ideia do fim-do-ano, o sonho do novo ano, nem me desilude o fracasso das promessas por cumprir. Talvez seja por nunca ter metido uma passa na boca, quando começava a contagem decrescente. Talvez seja ateu. Nunca acreditei naquela pressa toda. Como quem fosse apanhar o comboio. E eu nunca perdi um comboio. Mas depois olho para as pessoas. Vejo abraços e beijos. Dou, claro que dou. E sinto os olhos embaciarem, não sei porquê. Oiço os brindes, e tudo quer enterrar o passado. Começar uma vida nova. Rogam pragas ao ano passado. Pedem ao novo que seja melhor. Como a um convidado que não se conhece e a quem se quer dar uma chance. E lá fora ouvem-se os foguetes a explodir no ar o começo do ano novo, cheios de cor. Tão breves. Tão bonitos. E é então que eu disfarço. Porque eu não me afasto do que foi, nem do que vem. Quero tudo. E então disfarço.
Há algo de irresistível na ideia do fim-do-ano, do novo ano. Nunca saber onde é que se vai mesmo, o que vai acontecer. Que livros se vão ler, que discos conhecer, que filmes vão mexer, que concertos, quem irá tocar para nós. Como é amanhã. E quando se tem filhos a surpresa multiplica por mil. Todos os dias. O que é que vão fazer. O que é que vão fazer ? Não sei.

1 comentário:

  1. Idem nos olhos. Idem na curiosidade. Mais na esperança. Em frente é que é caminho e mais à frente é que está o melhor. Bom Ano

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