sexta-feira, 17 de julho de 2015

"O Syrisa já está destruído. Podemos agora salvar a Grécia ?"



«Chegará o momento em que tiraremos as mãos das carteiras e as poremos na consciência. Chegará o momento em que já não veremos os ricos que roubaram mas os pobres que ficaram. Em que não quereremos ressarcimento mas reparação. Em que perceberemos que não se pede sequer solidariedade, mas piedade. Em que nem os sádicos se divertirão com a espetáculo degradante dos políticos gregos. A União Europeia foi longe de mais na violência estéril e vingativa. Para destruir o Syriza está a ceifar-se um povo. Já não é indignação, é súplica: SOS Grécia. E se tudo o resto falhar, apele-se à inteligência, que não é de esquerda nem de direita, pois é preciso mudar aquele plano que, além de horrível, é burro, é mau, é pior para todos.
(...)
O bloco liderado pela Alemanha ficou tão furioso com o desplante do senhor Alexis Tsipras na marcação do referendo que quis devolver-lhe em dobro a lição de superioridade. Até se percebe a fúria, que segundo os relatos da reunião de domingo do Eurogrupo fez com que o senhor Wolfgang Schäuble berrasse. Alexis Tsipras foi arrogante, marcou um referendo pérfido e achou-se nimbado de invencibilidade com os resultados, como se fosse dar uma tareia moral aos demais estados membros. Mas a Alemanha quis tanto destruir o Syriza, por vingança e por dissuasão a que outros países elejam partidos radicais, que perdeu a noção da força. Mais um pacote recessivo vai destruir mais economia e mais emprego numa economia já exangue.
A vitória sobre Tsipras foi retumbante. Até o perdão da dívida, que o Syriza sempre reivindicou, é agora formalmente admitida pelo FMI, mas de forma a culpar o partido, que não tem nada para mostrar. É ridículo ouvir Alexis Tsipras dizer que assinou um acordo em que descrê. É degradante vê-lo tripudiar o próprio Syriza e ancorar-se nos deputados dos partidos que detesta e que o detestam a ele. É assustador ouvir a presidente do Parlamento (que pertence ao Syriza e se junta aos 40 deputados que se afastaram de Tsipras) falar em genocídio social. Mas a humilhação suprema talvez seja ver Tsipras dizer que não há alternativa. Tsipras, o temível mastim indomável, está amestrado como um caniche. Dá dó. A direita rejubila. Também dá dó. Porque ninguém para, escuta e olha para perceber na loucura que estamos a patrocinar.
(...)
Os gregos estão desesperados porque a situação é desesperante. Coloquemo-nos no lugar deles por um minuto: um governo de extrema esquerda ajoelhado depois de cinco anos de tareia, de desemprego e de austeridade, depois de décadas de corrupção e roubo institucionalizado com os governos de centro. E o que lhes dizem que se segue? Pobreza. Talvez a esta hora também estivéssemos na rua.»

in 'Expresso', por Pedro Santos Guerreiro

1 comentário:

  1. Mais um, dos inúmero, fantasticamente lúcidos textos do Pedro Santos Guerreiro (quase que custas escrever uma frase destas de um tipo da "economia") que no fim me parece mais esperançoso que lúcido… estaríamos? mais que um dia para colocar um grafitti? não há como não lembrar aquele dia que em setembro de 2012 as ruas se encheram e os ecos chegaram-me lá longe onde estava…. voltaria essa gente à rua? e ficaria lá? custa-me a crer (tanto)

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