(adquirido na Livraria "Sequoia", Travessa da Azurara, 45, Maputo)
"O pai chamava-lhe «burro» e o menino sorria. Chamava a esposa de «puta» e o filho voltava a sorrir. Pensavam que o rapaz reagia assim, placidamente, por causa do seu bom feitio. Ter bom feitio, nos dias de hoje, é um outro modo de ser burro. Mas não era feitio. Era um defeito. Quando o pai o chamava de «burro», o menino escutava «barro». E quando a mãe era insultada, ele convertia o insulto em silêncio.
Essa era a sua calada sabedoria: o melhor modo de evitar um conflito é escutar mal. Ou mal escutar, que é ainda mais difícil. Dos dois modos procedia o menino. E dizem que ele chegava ao ponto de acolher a ofensa como se fosse uma prenda. E tinha razão. Há neste mundo melhor que o barro ? O que mais pode ser, ao mesmo tempo, terra e água, mão, sede e cântaro ?"