«Natural do Pico, João Filipe era um pesquisador de ouro dos muitos que acorreram à Califórnia em meados do século passado. Sem sorte, foi obrigado a recorrer aos militares e trabalhar como aguadeiro num canto perdido da fronteira índia, Fort Kearney, no Nebrasca.
Numa manhã, dois mil índios Sioux comandados pelo chefe Nuvem Vermelha emboscaram uma patrulha saída do forte e massacraram os soldados. Em Fort Kearney foi o pânico, as armas e a pólvora que restavam eram poucas. O aguadeiro português fez-se voluntário para uma tarefa impossível: ir buscar reforços a Fort Laramie, trezentos e oitenta quilómetros a oeste. Tal como os filmes ensinam, homem e cavalo que se aproveitem da noite e da névoa da madrugada podem enganar índios. Quatro dias depois - Dia de Natal, o que sempre ajuda para fazer perdurar lendas - John Philips estava a bater ao portão de Fort Laramie. Um esquadrão de cavalaria chegou a tempo de salvar os sitiados. Os Sioux esperaram dez anos para saborear a vingança.»
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«Mas o homem ainda jovem que me levou ao jardim secreto de Valim quis-me contar uma história sua, de asfalto.
No mês anterior, ia para o trabalho pela "Freeway 5" quando viu, do lado de lá do separador, um carro indo no mesmo sentido. Os infelizes dos automobilistas da outra faixa guinavam, capotavam, chocavam entre si. O automobilista suicida prosseguia pela auto-estrada urbana em contramão.
- Pus-me a persegui-lo, lado a lado - disse-me George Fernandes.
Buzinou, gritou-lhe, mas do lado de lá do separador o outro continuava com o olhar vidrado, fixo na direcção indevida. Fernandes acelerou, travou mais à frente, saltou do carro e pôs-se na outra faixa agitando os braços como um pegador desesperado. O doido parou o carro, submisso. Já se ouviam as sirenes da polícia. Em Agosto de 1990, George Fernandes tornou-se o "cidadão do mês" de Sacramento, com foto em jornais e nome no telejornal.
- Mas o que eu gostei mais foi ouvir o polícia dizer-me: "Você tem uns tomates do caraças!"»

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