quinta-feira, 30 de junho de 2011

quarta-feira, 29 de junho de 2011

terça-feira, 28 de junho de 2011

A música do Avô - XI


Amou daquela vez como se fosse a última
Beijou sua mulher como se fosse a última
E cada filho seu como se fosse o único
E atravessou a rua com seu passo tímido
Subiu a construção como se fosse máquina
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas
Tijolo com tijolo num desenho mágico
Seus olhos embotados de cimento e lágrima
Sentou pra descansar como se fosse sábado
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe
Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
Dançou e gargalhou como se ouvisse música
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acabou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego

segunda-feira, 27 de junho de 2011

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Sem título


Estranhas que a vida continue.
Acontecem estas coisas, e estranhas que a vida não pare, suspensa para sempre, para outro dia apenas quando doer menos e possas regressar à tona.
Olhas para a janela e lá fora o carros circulam e as buzinas apitam. As pessoas saltam dos autocarros, os miúdos têm de ir para escola porque o despertador já tocou há meia-hora.
A rotina dos outros serpenteia pelo meio de ti sem dar por nada.
E os discos continuam a ter música e o Verão também chega. O vento ainda sopra. Os frutos têm de se apanhar e as ervas de se cortar. Dizem os motores dos jardineiros da Câmara.
Estranhas que depois de tudo o coração ainda bata. Mas bate.
Invejo o pesado elefante ansião que passa na planície seca da Savana, e se retira da manada quando a vida é demais e está na hora de morrer.
Se tudo passa, tudo vai passar.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

A música do Avô - IX



A música do Avô - VIII


Portugal é o Brasil

... excepto no ouro que sempre lhes brotou das minas e no Inverno que é só nosso.

O Advogado deixa Cascais. Audiência no Tribunal Criminal. Tira a gravata, guarda o blazer e arregaça as mangas. Monta a Vespa, apanha a Marginal que o dia está lindo e o sol já espelha no mar. Ah, livre ! Quem é que respira uma brisa como esta ?

E Portugal é o Brasil.
As praias da linha a deitar gente por fora. Cheias dos desempregados que vivem do rendimento mínimo à espera dos que vão chegar. Dos miúdos que já estão de férias (já estão de férias ?) a jogar bola no areal ou a dar uso às redes de volley de praia. As miúdas destapadas, quase mulatinhas, redondinhas, curvadinhas. Mas um bocado envergonhadinhas que isto ainda não é o Brasil.
As praias da linha parecem Ipanema, Copacabana ou a Barra da Tijuca, mas um nada envergonhadinhas. Barezinhos com velhos bronzeados e solteirões tatuados e de braços musculados, encostados ao balcão a beber um "chope" que cá é imperial.
Tipos de bicicleta, outros no jogging e miúdas também, de rabo-cavalo, óculos escuros e corpos atléticos com os peitos bem enérgicos e espetados para a frente, a antever os biquinhos.
Buzinam de trás que já vai devagar.

Portugal é o Brasil, e enquanto der, dá. Quando não der mais, samba. Dança.
O que chateia é que temos um Inverno. E pode dar Grécia.
Mas agora é verão, e enquanto der, dá.

terça-feira, 21 de junho de 2011

sexta-feira, 17 de junho de 2011

gente pequenina

Em Buenos Aires, Martín Palermo, símbolo máximo do Boca Juniors, despediu-se do clube más lindo da cidade (que tem o bairro mais colorido do mundo) como as imagens documentam (favor escutar o hino) e Maradona nas bancadas.
É assim que se tratam os filhos.



Nuno Gomes, um dos 10 melhores marcadores de sempre do Benfica, exemplo de lealdade, dedicação e respeito, teve direito a um telefonema.
E eu tenho direito a um pedido de desculpas.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

terça-feira, 14 de junho de 2011

Presente mais que perfeito

(Lindsay Lohan)
A propósito do post que antecede.

Pretérito perfeito

(Marylin Monroe)
A propósito da última sessão fotográfica em vida de MM.
De Bert Stern, e agora em exposição no Centro Cultural de Cascais, de 5 de Junho a 17 de Julho.

The Misfits, Miller, Marylin, Monty and... Clark Gable

"This book tells the story of the making of the legendary film The Misfits (1961), directed by John Huston and starring Marylin Monroe, Clark Gable and Montgomery Clift.
As part of the promotional strategy for the film, the world-famous magnum photographic agency was given exclusive access to the production. Nine of its best-known photographers covered events both on and off the set."

"The Misfits has nothing to do with the classic Western or with tradicional genre movies. It tells the story of people who are completely 'unbalanced' (...) three men and two women who form an isolated little community in the vastness of Nevada. What they have in common is a sickness, a psychological wound, a 'split' that prevents them living, and it is precisely this profound disablement that makes them so touching. They have difficulty in living in a world they cannot grasp, that no longer matches their dreams. In its own way, The Misfits is the story of an impossible dream, set in an America where the great myths have died."

quinta-feira, 9 de junho de 2011

terça-feira, 7 de junho de 2011

A música do Avô - I

Há coisas que se herdam ainda antes de sabermos quem somos, antes de olharmos para nós. Que vêm no sangue como um código de barras. Que dizem "tu és nosso." E nós somos.
Tu, Avô de Lisboa que eras do Porto e morreste há 14 anos. A quem nunca falei por tu.
Só agora, um ano depois de te seguir a mulher que te adorou, se começou a desmanchar o Lego da casa que já não é vossa, e reclama herança e partilhas.

Tinhas uma Biblioteca. E não era só de livros.
Uma fabulosa e impressionante colecção de discos de vinil enchia estantes e estantes da casa da Defensores de Chaves. Local sagrado. Quase puro, não fosse proibido. 
Como eu era miúdo, todas as tentações de ali entrar deviam morrer assim. Mandavam.
Todos os filhos e netos respeitavam essa ditosa lei, mas o meu atrevimento de nunca aceitar o não de uma vedação sem espreitar primeiro, punha-me a entrar às escondidas naquela sala.
Transido de medo. Da voz que mandava. De uma voz qualquer desde que fosse adulto. Do puxão de orelhas que as dobrava. E doía como nada. Pior. Da vergonha do ralhete. Do crime imputado em família.
Era inútil. Não conseguia resistir. Olhava maravilhado e absorto para o que escondiam aquelas proibidas prateleiras. Por miseráveis e desesperados segundos.
E como a tentação me corroía, não evitava tirar um ou outro disco para fora, e um ou outro livro. Só para os morder.
Com a consciência a grelhar-me o cérebro, punha-os logo no sítio (acho) e pisgava-me com o shot de adrenalina e o coração bombado para fora do peito.
Acho que nunca enganei ninguém.

Quando se começou a mexer nas tuas coisas, foi preciso saber o que fazer aos milhares de livros e discos que a vida das estantes carregava. Fez-se uma selecção, por áreas, estilos e autores.
E fomos descobrindo diamantes. Raridades, impecáveis, sem riscos ou nódoas. Sem pó.
Como este disco que me parou nas mãos: "The Jimi Hendrix Concerts".
Se alguém pode ser aquilo que faz, Avô Professor, Advogado, Juiz e Conservador, tu foste o Avô sábio e conversador do "10 a Comunitário ?? Deixa lá que quando trabalhares nunca ninguém te vai perguntar quanto tiraste nessa Cadeira." E é o que foste.


Ao vivo em Winterland, no Royal Albert Hall, em Nova Iorque, Berkeley e San Diego. Inclui versões de "Fire," "Voodoo Chile", "Hey Joe", e um estonteante solo que cobre o ar que respira quem escuta o "Little Wing".
A música. Esteve sempre lá. E cá.

domingo, 5 de junho de 2011

Melhor argumento para estas eleições

"Vou votar Jerónimo que é do Benfica."

(um amigo)

Lapidar.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Vão votar !

Há uma grande maioria de portugueses que parece que desistiu.
Não sabe em quem votar, porque não quer votar em qualquer dos candidatos. Não depois de Sócrates. Não porque Passos é Passos. Nunca Portas. E já nem a CDU ou  o Bloco que nem querem conversa. E como o resto é paisagem, então venha o mal menor e votar afinal Passos ou, pior, Sócrates. E assim vamos, de mal menor em mal menor, num deplorável e degradante exemplo da democracia em que nos tornámos. Do pior que ela pode ser. Em que não se escolhem os melhores da Polis, mas os menos maus. E isso é muito mau.
Então, o que já apetece mesmo é abstenção. Porquê ser cúmplice ? 
Só que isso é desistir. É uma enorme desilusão metida num saco de cobardia. É deixar que nos vençam pelo cansaço. É deixar que chamem a esse não-voto o voto de um morto, dos milhares de eleitores que votam depois de mortos.
Pior. É acusar-nos de não querermos saber e isso é só culpa nossa, porque não vamos, porque queremos é Sol e foi tudo para a praia, porque a data isto e aquilo.
E então o não-voto torna-se numa coisa que não é. Porque lhe chamam outros nomes. E nada deixam que se discuta ou questione. Porque é a praia e são os mortos que estão a falar. Imbatível.
O que não retira que Cavaco Silva tenha sido eleito por um (1) reduzido milhão de portugueses. Que só 40% quiseram escolher ? Quem é que ele representa ? Onde é que fica a Democracia depois disto ? 
Só o voto em branco pode resgatar o que sobra de Abril. Porque o voto em branco não desiste. Acredita que pode (ainda) mudar. Que pode fazer a diferença. E isto é protesto. Isto é o fight-club. Porque não se acredita na oferta.

Imaginem que 60% dos portugueses voltam a não aparecer no domingo.

Agora imaginem que tinham aparecido e eram votos em branco.

Tinham um destino. Falavam. Ninguém os podia esconder.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Beijo a um filho desconhecido

Que triste.
Tu sabias tudo de nós. E nós só adivinhávamos.
Viveste submerso no oceano escuro da tua mãe que era o melhor coito que podias ter. Mas depois desaguaste num rio enorme de sangue que quase a matava.
Mas que triste.
Nunca saberás como é lindo viver e como são lindos os dias, mesmo os que não são.
Como é louco o irmão que não tiveste e tão bela a flor da sua irmã. Quem eram os teus avós e o que te podiam ensinar, e as meninas que eram primas.
Nunca saberás o que é dormir com a mulher que se ama ou a surpresa de um beijo.
Como é bom mergulhar no mar e deixar escorrer o sal para dentro dos olhos. E espojar na areia do Verão.
O que é ter bons amigos e passar noites em claro a viver com eles, e acordar no dia seguinte com uma ressaca de rebenta-miolos e depois limpar isso tudo a apanhar uma onda ou ir para um campo de futebol.
O que é pegar num carro pela primeira vez, que tem um rádio velho onde se ouvem os Led Zeppelin. E como é bom sentir o cabelo solto numa mota porque se arrisca e hoje não ponho o capacete.
E nada compensa mais do que acreditar e depois defender, sobretudo quando censuram.
Que viajar é a melhor coisa do mundo. De comboio.
Como é o mar em Zanzibar. Como são vazios os desertos de Sprengisandur ou do Sahara mas que nos fazem sentir homens de verdade. Ou como se agradece a Deus beber um gin tónico enquanto se olha para as multidões na praça Jemaa el-Fna.
Como são frescas as manhãs em Buenos Aires, e porque Roma, Paris ou Nova Iorque tinham mesmo que haver. Para nos fazer felizes.
E também não verás a vertigem do abismo dos Cliffs of Moher ou terás o sabor de uma Guinness na boca. Num pub de Belfast cheio de fumo.
Tudo o que tanto nos dão os livros e o cinema. Tudo o que não tem conta. Como uma árvore, um cheiro, uma luz. O pôr-de-sol em Santa Cruz ou o calor que não respira do Alentejo em Agosto. O que é ajudar o pai nas vindimas ou na apanha.
Nunca ouvirás o Requiem de Mozart, nem irás sacar acordes nas guitarras do teu pai. Pensar em música e que se não houvesse sons era eu que os fazia a todos.
Nunca saberás como dói perderes alguém que amas.
Ou o milagre de ter um filho. Que não podias ser.

Beth's (Mysteries)