Em qualquer sociedade baseada no racismo institucionalizado, a miscigenação desafia o sistema, apontando-o como injusto, insustentável e incoerente. A miscigenação prova que as raças podem misturar-se (e, em muitos casos, querem misturar-se). Visto que um mestiço personifica essa falha na lógica do sistema, a mistura de raças torna-se um crime pior do que a traição.
Só que, como os humanos são humanos e o sexo é o sexo, a proibição nunca impediu ninguém de contorná-la. Já havia miúdos mestiços na África do Sul nove meses depois de os primeiros barcos holandeses terem chegado à baía da Mesa. Os colonos na África do Sul aproveitaram-se das mulheres indígenas, como é, aliás, costume dos colonos. Mas ao contrário do que aconteceu na América, onde qualquer pessoa com uma gota de sangue negro se tornava automaticamente negra, na África do Sul as pessoas mestiças foram classificadas num grupo à parte, nem negro, nem branco, mas "de cor". As pessoas de cor, os negros, os brancos e os indianos eram obrigados a registar oficialmente a respectiva raça. Com base nessas classificações, milhões de pessoas foram desenraizadas e deslocadas. As áreas indianas foram segregadas das áreas de cor, que, por sua vez, foram segregadas das áreas negras; e todas elas foram segregadas das zonas brancas e separadas umas das outras por zonas-tampão de terra desocupada. Foram aprovadas leis que proibiam o sexo entre europeus e nativos, leis essas que, mais tarde, foram emendadas para proibir relações sexuais entre brancos e todos os não-brancos. (…) Os infractores arriscavam uma pena de prisão de cinco anos. Havia esquadrões policiais cuja tarefa era espreitar por janelas (…) E se um casal inter-racial fosse apanhado, Deus o acudisse. A polícia arrombava a porta ao pontapé, arrastava os criminosos para a rua, espancava-os e prendia-os. Era, pelo menos, o que faziam ao negro. Ao branco era mais: "Bom, eu digo que estava embriagado, mas não volte a fazer isto, sim ?».
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