(Luanda, "Lusa")
Não como antes. Não com duas pedras da calçada a fazerem de baliza na rua do bairro. Não sem partir os vidros da porta ao lado da "Espanhola". E ser perseguido depois, sem a bola de "cautchu" debaixo do braço porque a tinham confiscado e o tributo era justo.
Não no campo de terra batida e pedras com dentes, que tinha duas balizas de ferro vermelho, tal a ferrugem, e que era o melhor estádio do mundo. Mesmo quando jogava com um gesso enfiado no braço que tinha partido de véspera. O campo que mataram para construir um colégio privado que consegue as melhores notas de Lisboa. Que não posso perdoar.
Não nas traseiras das "Arcadas", no jardim que era inclinado e tinha dez árvores no meio para a gente fintar. Que era bom só porque tinha relva. Na altura em que queríamos fazer a equipa do Restelo F.C., com emblema feito à mão e equipamentos que nunca vieram.
Não nas farpas de alcatrão da Secundária, inimigo como uma lixa, e que nos rasgava de ponta a ponta. Ténis, joelhos, cotovelos e a alma, se nos mandavam ao chão. E como era fácil acabar no chão. E chegar às aulas mergulhados em suor.
E também não naqueles pavilhões de "gramado" escorregante e gasto com balizas para o andebol, mas que davam bem porque tinham uma rede para segurar os golos. Que celebrávamos, porque éramos rapazes e havia uma bola.
Continuamos a jogar à bola. Nos dias em que o dilúvio não é só uma história das sagradas escrituras. Nos torneios da Agronomia. Com botas e bolas de cabedal. E agora equipamentos. Um senhor árbitro até. E duas idas à faca e este joelho de guerra, marcado e sem menisco, e com tendões remendados de outro lado a fazer de ligamentos. E está muito bem. E ouvimos ao fundo: "Cuidado André, não vás a essa.", e um gajo obedece, e sorri porque ele sabe, e porque temos memória e não gostámos de sofrer.
Continuamos. Porque somos rapazes e há sempre uma bola.
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