domingo, 17 de fevereiro de 2013

Porto Song

(foto: andré)

Já amava o Porto.
Não como Lisboa, isso é óbvio. 
Não. Lisboa é como a mulher mais linda do universo. Linda, linda de morrer, tão linda, que só pensamos na sorte que tivemos na puta da vida para vir parar aqui.
Quando falam da luz de Lisboa é isso. O brilho que vem do mar e inunda as ruas. Que reflecte do sol nas pedras das calçadas. O sobe e desce das ruas que tudo alcançam, para tudo mostrarem, em ilimitada generosidade. Que se cruzam permanentemente para dizer que um dia pertenceram ao reino de Al-Andalus. O aperto, enfim, que nos ata e faz reféns. A essa mulher, que só de existir nos faz felizes, que faz tudo para nos ver felizes, somos fiéis eternamente. Porque é um amor que vence tudo.
Não, o Porto é como a mulher feita, a mulher madura. A mulher antiga, honesta. A mulher moral. Aquele tipo de mulher que tem coração de ouro e nunca esquece como receber. A mulher castigada também, que vem da dureza da vida. Que sabe que a vida não é só bela. Não é só arte, nem nunca vai ser. Que tudo guarda no coração. Com recato e também carinho. Os bons e os maus cheiros.
Amava o Porto, não há dúvida. Não como Lisboa, mas porque lá vai há anos e é sempre metido no colo. E como ele gosta disso ! E dos prédios velhos, esguios, dos prédios escuros e húmidos que o sol não cura, nem deita abaixo.
O Porto que era do Avô de Lisboa, que costumava debitar as declinações de latim para o pai professor a caminho do Liceu Alexandre Herculano. Onde começou a advogar e donde partiu para namorar e depois casar, que era um amor muito mais forte. Onde depois regressou só para ver o primogénito nascer em casa.
Depois não quis mais nada com a cidade, nem com a casa de Santos Pousada, por lhe lembrar demasiado a mãe. Vendeu-a como quem queima mobília numa lareira.
E agora ele, que nunca tinha passeado com o Avô no Porto, gostava de imaginá-lo nas esquinas que hoje dobra. E do que podiam conversar.

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