quinta-feira, 27 de abril de 2017

Devils and Dust


«Voltei muitas, muitas vezes para visitar aquelas ruas, percorrendo-as em tardes de sol, noites de inverno e às horas desertas do anoitecer. Descia a Main Street depois da meia-noite a observar, à espera de que alguma coisa tivesse mudado. Olhava para as janelas iluminadas das casas por onde passava, pensando qual delas seria a minha. (...)
Voltava vezes sem conta, em sonhos e sem ser em sonhos, à espera de encontrar um novo final para um livro que tinha sido escrito há muito tempo. Guiava como se aqueles quilómetros pudessem reparar os estragos feitos, escrever uma história diferente, obrigar aquelas ruas a revelar os seus segredos tão bem guardados. Mas não podiam fazê-lo. Só eu é que podia, e eu estava longe de estar preparado para isso. Iria passar a minha vida na estrada, percorrendo centenas de milhares de quilómetros, e a minha história seria sempre a mesma... o homem chega à cidade, dispara; o homem vai-se embora da cidade e afasta-se por entre a escuridão; depois, fade to black. Tal como eu gosto.
Do meu poleiro no alto do colchão, vi as rodas da carrinha atravessarem a cidade, virarem à esquerda para a Highway 33 e ganharem velocidade a caminho da brisa do oceano e da nova liberdade da costa. Com a noite quente a sussurrar-me ao ouvido, senti-me maravilhosa e perigosamente à deriva, com vertigens, tamanho era o meu entusiasmo. Aquela cidade, a minha cidade, jamais me deixaria, e eu jamais conseguiria deixá-la completamente - mas não voltaria a viver em Freehold.»

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