terça-feira, 24 de abril de 2012

Eh, pá...



«Não há resposta científica para algo que decorre da fé. O facto de eu não ter religião, e de pensar que a religião é um produto dos homens, permite-me ter a distância que de algum modo um jornalista pode ter. Não parto para a análise da religião com um "parti pris" de ateu. Parto para a análise da religião como fenómeno humano, que é o que me interessa.

As religiões são profundamente desconhecedoras das suas vizinhas. Os sunitas desconhecem tanto os xiitas quanto os católicos desconhecem os protestantes. Em Alepo, em 2007, num encontro ecuménico, defendi isto: pelo menos podemos concordar que o homem inventa Deus à sua semelhança. E no fim eles declararam-me crente: você acredita no homem. E eu disse que sim. Tive que dizer. Mas, de facto, hoje não tenho uma crença particular no homem. Transitei do cristianismo para o marxismo bastando-me acreditar no homem. Substituí uma crença por outra. E hoje estou convencido de que o homem é capaz do pior e do melhor, e que não há nenhum destino escrito. Não há uma bondade inata que, no fim, triunfe sobre o mal. É possível, aliás, que o mal triunfe. Tenho a certeza absoluta que se quiser algum bem tenho que lutar muito, e que vale a pena fazê-lo. Mas hoje a minha relação com a crença na humanidade resume-se a quase uma atitude egoísta: poder chegar ao fim da vida e achar que, apesar de tudo, fui útil, não sacaneei o próximo, não fiz coisas de que me tenha mesmo que arrepender. Que a minha vida teve algum sentido - e só entendo a minha vida com outros.»



ENTREVISTA: Alexandra Lucas Coelho, no lançamento do livro 'Périplo'
ípsilon 11.06.09


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