domingo, 10 de novembro de 2013

Buenos Aires - 2º dia


(foto: cristina)

Buenos Aires. Duvido que haja cidade com nome mais bonito. Talvez Lisboa. Mas essa é pátria. Não sei.
Quando viajo é para me levantar cedo e atirar-me para as ruas. Um miúdo numa loja de brinquedos. Tomar um grande pequeno-almoço e submergir. Chupar tudo. Engolir mais.
Decidimos apanhar um táxi (a preço de saldos) e ir para 'La Boca'. Bairro pobre, do Caminito, canción. Gardel. Bairro rafeiro de navalha à cintura e tatuagem nos braços. Rostos trigueiros e rostos traçados de rugas. De olhos rasgados e cicatrizes na alma que nos miram desconfiados. O estrangeiro aqui é penetra. Não se contam os segredos de família e não se diz de quem é o filho. Bairro azul, amarelo, verde, vermelho. Cores violentas. Berram ao máximo. Cores puras. Verdadeiras, sem meias-tintas. Bairro do clube más lindo. Clube do povo. Operário. Fiquei Boca acho que logo.
Entramos num velho café de esquina, de portas que chiam. Em Buenos Aires, tropeçamos neles. Fumo um cigarro ou dois. Olho bem para as pessoas. Jornais espalhados no balcão. Escuto as conversas do dia. Dois velhos de voz rouca comentam o jogo da véspera. Têm um charuto nos dedos e pedem um uísque. O cabelo branco puxado atrás, muito penteado. Oiço aquele espanhol açucarado, cantado, espanhol meio italiano meio brasil de tantas emigrações. De tanta gente. Fico apaixonado. Falo com eles. Como eles. Falamos dos tempos maus. Da ditadura. De Ménem e do futuro Kirshner. Da economia. Deliram porque vão correr com a Repsol do país. Falo de Portugal. Querem saber da Europa como se fossem primos. Distraio-me e olho pela janela baça. Que longe de Lisboa!
Deixamo-nos estar um bocado mais por ali. Acho que arranco um bife de chorizo, puro sangue. Alto e grosso. Cheio de carne.
Regressamos ao centro e percorremos as avenidas largas e que não acabam. É quando a Cristina encontra um Teatro construído com histórias. A "Ateneu". Agora é celebre. Subimos aos camarotes para ver os romances. Na plateia, a política e a história. No primeiro balcão vejo livros de cinema, música, fotografia e arte urbana. Pegamos nuns, olhamos para outros e acabamos no segundo balcão com as obras dos embaixadores. Piazzolla e "Fervor de Buenos Aires" do J.L. Borges.
Não sei se ainda existe, mas no "Camaná" partilhámos, finalmente, o primeiro mate, espécie de chá feito da erva com o mesmo nome que levam com eles para todo o lado.
Insuportavelmente amargo. Cometemos o pecado capital. Juntamos açúcar porque tinha que ser. Quando o amargo acaba de afastar o intruso, esvai-se completamente como se fosse por um cano à parte e deixa um sabor calmo debaixo da língua. A vida é boa.

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